sábado, 9 de novembro de 2013

Mochilão 3 – Cuzco, Ollantaytambo, Águas Calientes e Machu Picchu


" A mente que se abre a uma nova ideia, jamais volta a seu tamanho original." Albert Einstein


Antes de começar a famosa subida até uma das sete novas maravilhas do mundo, gostaria de tentar descrever uma sensação que eu só conheci depois que passei a viajar.

Estar em um lugar único é algo inesquecível, é como ser único também. A sensação é quase indescritível. É como se todos os seus problemas e pensamentos fossem separados da sua alma e só existisse você e a natureza. Sentir o vento gelado batendo no rosto; Aquela sensação de adrenalina percorrendo as veias;  Sentir-se em totalidade. A plenitude invadir seu espírito; Seus sentidos ficam mais aguçados. Você sente, ouve, percebe, cheira, toca e vê, e parece que também é sentido. É uma troca privilegiada com o ambiente. São momentos únicos que acredito eu, sejam excepcionais para a vida de cada pessoa. 

Todo o caminho para Machu Picchu foi exatamente dessa forma que me senti. O cansaço, as dores da caminhada e os efeitos da altitude não me abalaram. Não senti medo ou receio em momento algum. Sentia-me renovado pela força da natureza e pela vontade de chegar até a lendária cidade inca.
Gostaria de pontuar para os leitores deste blog, o que foi a Civilização Inca, os fundadores de Machu Picchu.


“Os Incas”foi um império que incluía muitas outras culturas pré-colombianas e que partiam do Norte do Chile e nordeste da Argentina, chegando até o sul da atual Colômbia. A Civilização chegou a alcançar quase 20 milhões de pessoas, e sua capital era a atual cidade peruana de Cuzco, o umbigo do mundo. O soberano maior era o filho do sol, que na sociedade, tinha status de Deus.
Os Incas foram vencidos pelos espanhóis,e  entre as heranças que essa civilização nos deixou, estão grandes ensinamentos; línguas que até hoje são faladas em alguns países como o quíchua e aimará; e a famosa e misteriosa Machu Picchu.
...
Nossa partida para Machu foi cedo. Chegamos à Praça de Armas de Cuzco, onde nossa van estaria nos esperando às 8 da manhã. Aproveitei que o céu estava muito azul e tirei várias fotos do lugar encantador.  A van se atrasou um pouco para aumentar a ansiedade.

A clássica foto do grupo todo antes da partida para a aventura

O céu azul de Cuzco

 Levei uma mochila de costas, estilo mochileiro. Nela, o que encontrei essencial para a caminhada foi bloqueador solar, remédio para mal-estar, bolachas, repelente para insetos além de muita água e roupa para calor e frio. Não se esqueça de levar o passaporte, pois em Machu Picchu você poderá carimbá-lo.

Antes de sairmos de Cuzco passamos para buscar um grupo de israelitas, e dois britânicos que fariam a viagem conosco. A viagem de van foi uma aventura inesperada e animada. O caminho até a hidroelétrica é recheado de perigos. Você passará por meio de rios, zonas de derrube de pedras, precipícios, e pontos extremamente altos. 

Apesar da altitude eu não passei mal. O que me deixou um pouco tonto foram as longas voltas que o carro dava. Estive sentado ao lado da janela e do precipício, uma experiência no mínimo aterrorizante. A cada  solavanco, já me imaginava caindo do meio daquelas pedras.  O motorista, monossilábico, aumentava o tom de adrenalina, pois não parecia nem um pouco preocupado com o abismo e muito menos com a velocidade. Em vários momentos tivemos que dividir o espaço, já pequeno, com outro carro que vinha na direção contrária. Eram minutos de tensão, no qual até os menos nervosos, esticavam o pescoço para analisar a situação. Apesar da aflição contínua nas horas que duraram essa viagem, eu me diverti muito. Estava  extasiado com as lindas paisagens.  



As montanhas contrastavam as paisagens verdes



A estrada se desenrolava por um precipício entre as montanhas


 O Peru é um dos países mais lindos do mundo. Montanhas, pastos verdes, rios extensos, aldeias isoladas. Tudo isso se misturava na minha janela, e aquela sensação de deslumbramento enchia meu peito. As horas na van foram intermináveis, porém as paisagens pagavam o preço da viagem quase suicida.

Nosso grupo, como já mencionei, era muito divertido. Todo o caminho tentamos contato com os estrangeiros da van. Viajamos com três israelitas que estavam fazendo um mochilão pela América do Sul. Um deles falava um ótimo espanhol, além de inglês; a israelita falava um espanhol ruim, e um ótimo inglês; o terceiro apenas observava nossos diálogos que não pareciam fazer sentido para ele. A moça, pelo que pareceu a meus companheiros, gostou de mim, hehe, sou garanhão.

Os dois rapazes de Israel - o risonho fala bem o espanhol

 Eles contaram que em Israel, todos são obrigados a frequentar o exército por dois anos, com a opção de ficar um ano extra, ganhando por isso.  Com o dinheiro juntado eles resolveram viajar. Apesar de parecerem muito amigos o grupo se conheceu durante a viagem. 

Os britânicos não falavam espanhol, mas depois de algumas tentativas de diálogo se mostraram muito simpáticos. Eu era o único do grupo que falava um pouco de inglês, os outros, como todo bom latino, se esforçaram muito.

Fizemos uma pequena parada para ir ao banheiro no caminho e outra para almoçar, o que me permitiu algumas lindas fotos. Chegamos à hidrelétrica depois de algumas horas de viagem. O lugar estava cheio de viajantes que caminhavam juntos pelas linhas do trem no meio de uma floresta tropical rumo ao povoado de Machu Picchu, Aguas Calientes. Você pode tomar o trem até Aguas Calientes que custa em torno de $40, R$30,00, mas não sei se vale a pena.


Bora pra Machu?
Preparado para a trilha



















A van nos deixou aí, com promessa de voltar para nos buscar no outro dia. Sem guia, seguimos viagem caminhando em meio à mata. Essas próximas duas horas foram de extremo cansaço e para mim únicas.

Senti-me em um dos muitos filmes de aventura que já assisti. Com a mochila nas costas seguimos por um caminho de fácil acesso. O segredo é seguir os mochileiros e a linha do trem. Não tem erro. A dica é: Não tente caminhos alternativos para não se perder.


Eu me maravilhei com a paisagem verde; o Rio gelado que nos acompanhava com o seu zumbido natural; o clima tropical e o som dos animais. Eu sentia falta do verde e do som dos pássaros. Se tem uma coisa que aprendi vivendo fora do Brasil é que o nosso hino tem razão quando diz: “Nossos bosques têm mais vida", e a Canção do Exílio não foi mais feliz ao afirmar: “ Os pássaros que aqui gorjeiam não gorjeiam como lá”. O Brasil é muito parecido com o Peru nesse aspecto.


Outro motivo de essa caminhada de duas horas ter sido inesquecível para mim foi o fato de estarmos sempre conversando com pessoas de todo o mundo. A cada novo “ Where are you from?”, nos maravilhávamos com países de todos os lados: Angola, Zimbábue, Cingapura, Estados Unidos, Alemanha, Austrália, Rússia... A troca cultural foi incrível.

Alguns minutos de descanso na trilha

Estar dentro da natureza te proporciona muitas surpresas. Eu, com minha curiosidade, sempre acabava me deparando com alguma paisagem distante ou algo diferente, e parava para tirar fotos ou ver. Muitas vezes fiquei para trás na caminhada. 

Outro momento único foi quando uma espessa chuva começou a cair por entre as árvores. O calor era forte e ninguém se preocupou com ela. A noite começou quando ainda caminhávamos e com ela as estrelas se misturaram com os vaga-lumes que iluminaram a floresta. No Chile, devido ao clima mais frio, é quase impossível encontrar insetos como esses. Os chilenos ficaram maravilhados, e confesso que nesse momento, me senti pleno, apesar do cansaço. Olhávamos para cima, como crianças, em busca das pequenas luzes que nos guiavam para o povoado. Confesso que algumas lágrimas de emoção caíram ao finalizar a caminhada.


Estávamos divididos em dois grupos, e eu estava um pouco preocupado com o outro pessoal  que tinha ficado para trás. Quando finalmente nos juntamos, descobrimos que um de nossos companheiros e meu amigo de faculdade, Bastián, estava passando mal, provavelmente efeito da altitude. 

Na praça principal de Aguas Calientes tive a agradável surpresa de encontrar uma amiga de Santiago e tiramos uma foto para marcar o encontro.

Eu + Jabi, a chilena mais louca, nos encontramos em Aguas Calientes

Cansados e com muita fome, fomos para o nosso hostel para depois jantar em um restaurante próximo, tudo incluso no pacote. Durante o jantar nossos guias  nos passaram as coordenadas. Partiríamos às cinco da manhã do dia seguinte. Era momento de descansar. Percorri um pouco o povoado antes de dormir. É um lugar encantador, muito bem organizado e cheio de turistas. As ruas são bem características e muito bonitas. Lembro-me até hoje que havia vários brasileiros comemorando a vitória do Atlético Mineiro na libertadores. Voltei pro hostel. Fechei os olhos e parece que já tive que acordar.





















Às quatro e meia da manhã já estávamos todos de pé. A adrenalina da caminhada do dia anterior ainda percorria nosso sangue. Durante a madrugada choveu e trovejou muito, o que me preocupou. Tínhamos que comprar nossa passagem de ônibus até Machu Picchu antes de enfrentar a fila. 

Os ônibus para a subida saíam de cinco em cinco minutos. Isso nos custou cerca de R$18,000 apenas a ida, já que pensávamos em voltar a pé. Você tem a opção de ir caminhando ao invés de ir de condução. É uma caminhada de quase duas horas subindo a montanha. Como choveu muito, decidimos não arriscar. 

Estava muito frio e ainda chuviscando. A fila, apesar de grande foi rápida. De ônibus levamos 20 minutos para chegar à entrada de Machu. Estava muito cheia naquela ocasião. Uma fina garoa molhava nossas capas de chuva e uma neblina intensa ameaçava nosso passeio. Nosso guia iria nos esperar em frente ao parque às sete da manhã. Juntamo-nos com ele e começamos nossa caminhada.

Um pouco de Machu Picchu: 


Machu Picchu, significa em quíchua"velha montanha", também chamada "cidade perdida dos Incas", é uma cidade pré-colombiana bem mantida, localizada no topo de uma montanha, a 2400 metros de altitude, no vale do rio Urubamba,  Peru. O lugar é o símbolo mais alegórico do Império Inca,  devido à sua original localização e características geológicas,  e à sua descoberta tardia em 1911. Apenas cerca de 30% da cidade é de construção original, o restante foi reconstruído.
Nunca encontrada pelos espanhóis, foi o professor norte-americano Hiram Bingham quem, à frente de uma expedição da Universidade de Yale, redescobriu e exibiu ao mundo Machu Picchu em 24 de julho de 1911. Este antropólogo, historiador e explorador aficionado da arqueologia. Bingham criou o nome de "a Cidade Perdida dos Incas" através de seu primeiro livro, Lost City of the Incas.
Hoje Machu Picchu é visitada por milhares de turistas, e é uma das novas setes maravilhas do mundo moderno.

Logo de início não podíamos enxergar quase nada devido a neblina. Seguíamos a guia, que contava as histórias de cada construção e cada esquina do lugar. Eu estava muito ansioso. Queria registrar cada instante. Tocar aquelas paredes. Sentir aquele ambiente único. A beleza do lugar é espantadora. As montanhas ao redor se desenham e criam uma atmosfera  surreal.

A neblina e a chuva nos atrapalhou no inicio da visita
É incrível como tudo aquilo ficou perdido durante anos. A inteligência dos incas em preservar sua agricultura, arquitetura, em como se organizavam. É maravilhosa. A forma como as paredes são construídas, como as pedras são expostas e como cada espaço tinha sua utilidade para eles é extraordinário. Conhecer Machu Pichu, além de magnífico, é ter uma aula de história.


O relógio inca
Com o amanhecer, a neblina foi se dissipando aos poucos e pudemos enxergar um pouco melhor. No meio dos pastos, lhamas comiam tranquilamente, enquanto os guardas buscavam pessoas que podiam estar fazendo dano ao parque. Conta-se que a cidade perdida está cedendo devido ao grande número de visitantes, e é por isso que as visitas estão sendo cada vez mais restritas.

A pedra com o formato da montanha. Imagem: Net



Com a neblina, a montanha não podia ser visualizada


 O tempo passou muito rápido durante nossa visita. A viagem com o guia tinha acabado. Tínhamos mais algumas horas para aproveitar para percorrer sozinhos. Apesar  de melhor visibilidade, o frio era intenso. Decidimos tentar subir a montanha Machu Picchu, já que tínhamos comprado a subida.

No meio do caminho da montanha Machu Picchu


Dividimos-nos novamente e fizemos a tentativa. Cansados e um pouco frustrados com a falta de visibilidade, desistimos na metade do caminho, pois nos restava pouco tempo em Machu Picchu. Quando descemos novamente para o parque, o céu começava a se abrir, e avistei uma das imagens que para sempre permanecerão na minha mente. A vista da cidade perdida do alto. As formas e construções mescladas com a vegetação e as montanhas daquela região única nesse mundo. Aquela sensação de plenitude, descrita no início desta postagem, novamente me preencheu e todo e qualquer esforço valeu a pena. Eu me sentia completo.





Alguns momentos valem a pena pelo resto da sua vida
Tiramos várias fotos, já com o tempo mais aberto, e depois de aproveitar nossos últimos minutos em Machu Picchu descemos para então voltarmos até hidrelétrica, onde nossa van nos esperava. Até lá eram três horas de caminhada, mas depois dessa experiência, eu tinha energia para mais de dez horas.
A viagem de hidrelétrica para Cuzco foi mais para descansar. O nosso cansaço venceu nossa aflição com o caminho, e apesar de boa parte da passagem de volta ter sido a noite, eu pouco me preocupei.
No dia seguinte, nos despedimos de Cuzco, uma das cidades mais lindas em que já estive. Nosso próximo destino: Puno, e depois Bolívia.


"Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser; que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver." Amyr Klink

6 comentários:

  1. Amo como você escreve, me faz sentir a sua emoção por meio de palavras, isso é incrível!

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  2. Não sei se pq Machu Picchu exerce uma fascinação especial em mim e nas pessoas que conheço achei esse texto o mais saboroso. As palavras do Klink para finalizar não são apenas palavras bonitas, são uma urgência para pôr em prática. Gosto de falar isso para todo mundo que pensa em viajar mas posterga, preferindo deixar a ideia mofar em algum cantinho do cérebro, algo a ser realizado em algum momento qualquer da vida: qdo houver tempo, dinheiro e menos medo. E nem me refiro às viagens especiais como essa que vc relata, mas de qualquer viagem. Pq, com ou sem fotos, elas sempre permanecem na memória, pelos mais diversos motivos: a paisagem, a história, a companhia, o significado particular. Pq ser inesquecível é algo intrínseco das viagens. Ter conhecido Machu Picchu e tudo mais foi um privilégio (a forma deslumbrada como vc exprime suas sensações, cheiros e até o cansaço extasiado me parecem evidência de que tem consciência desse privilégio) e dividi-la via texto sincero é uma bondade. Espero que a mensagem fique p as pessoas, de que é indispensável partir. Se for pela América do Sul, só para provar que longe não é sinônimo de melhor, ótimo. Se não, que seja para qualquer lugar. Além disso, seu texto é um guia prático para quem quer se aventurar pelo mesmo caminho. E espero que vc conheça muitos lugares e que todos lhe garantam deslumbramento. Pq se deslumbrar sempre é uma benção.

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    1. Muito Obrigado por essa poesia em comentário Will. Você é sempre o melhor.

      Wilton

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